Apertou a mão de todos e antes de se sentar na cadeira ao lado da bandeira boliviana, fez piada com nosso amigo Lucas. “Esse é o africano do grupo. Só porque é o mais moreno faz o trabalho duro”, brincou pelo fato de Lucas cumprir a tarefa de segurar a haste do microfone.
Para a produção do documentário nos interessava falar da história de Evo até chegar à cadeira mais cobiçada da república, de como articulou o movimento cocalero com todos os outros movimentos sociais do país e de como se posicionava frente à forte oposição da direita. “Nosso maior inimigo atual são os grandes meios de comunicação”, definiu sem rodeios.
E não precisa ser ele a dizer isso. Assistindo aos telejornais das grandes redes, percebe-se uma campanha sistemática contra o governo e contra o processo de transformação exigido pelos movimentos sociais. Os diários impresos também nao ficam pra trás e quase sempre editorializam a cobertura política, esquecendo da informação factual.
Evo falou ainda da luta cocalera e de como os movimentos organizados se fortaleceram num processo de reação às políticas de neoliberiais dos governos anteriores. Falava do mal papel norte-americano enquanto relaxava os ombros e deixava os braços cairem no contorno lateral da cadeira. Reclamava do protocolo e da segurança que tinha que se submeter enquanto enfregava uma mão na outra e as guardava entre as pernas.
Apesar do cansaço aparente (enfrentou o maior Paro Cívico do país no dia anterior), em poucas ocasioes desviou os olhos dos meus. Visão firme, falava sem capas e sem esconderijo. Uma entrevista franca, mas sem palavras excessivas, cuidado natural de um chefe de estado acostumado a ser qualificado de "índio incompetente".
O tom intimista foi uma constante e a impressão mais forte é de que estávamos diante de um homem simples, real representante das classes populares: um homem do povo. Ele despreza as técnicas comunicativas utilizadas pela maioria dos habitantes do campo político e fala com naturalidade.
As suas origens de pastor de lhamas, quando criança, e de campesino cocalero, já adulto, não ficaram, ao menos aparentemente, do lado de fora do palácio presidencial. Numa tentativa definir sua própria representação nacional, ele emendou. “Os movimentos sociais são muito mais importantes que Evo Morales”.


Entrevista com o presidente Evo Morales. Essa é outra cena do filme que você nao pode perder. Gravada hoje no Palácio Quemado em La Paz.






Falou sobre um acordo de cooperaçao com o Brasil para funcionamento de uma fábrica de papel e um outro acordo com médicos cubanos para implantaçao de um centro oftalmológico para os habitantes da regiao. 






Política a parte, deixo aqui mais um registro: é complicado comer na Bolívia. Falo de falta de higiene. Muitas vezes, os alimentos são colocados a venda em recipientes sujos. Já tivemos o prazer de encontrar cabelo na comida mais de uma vez. É comum ver o vendedor pegar o troco do dinheiro com a mesma mão que corta a fruta do suco. Sem nem lavar, sem nem utilizar uma luva. Ou então poe o pesão em cima da bandeja de sanduiche depois sai para vender em plena partida de futebol como se nada tivesse acontecido. Sem falar que a base da comida típica bolivana é ovo, carne e pollo [frango]. Pollo caprichado em gordura para todos os lados. Isso quando não é dia de panza, uma espécie de bucho a milanesa, já citada aqui no blog pelo companheiro Sangiovanni.








Cerca de 62% da população boliviana é indígena, sendo a maioria de origem quechua e aymara. De acordo com a Comissão Economica para a América Latina (Cepal), 72% dos indígenas vivem em áreas rurais e tem dificuldade de acesso a água potável, além da falta de infra-estrutura para saneamento básico, fato que contribui para uma alta taxa de mortalidade infantil, sendo considerada a mais alta da América do Sul. De descendencia indigena direta, o próprio presidente perdeu seis irmãos ainda na infância. Uma das marcas do governo Morales é o investimento em melhorias para os indigenas, a começar pelo reconhecimento étnico-cultural dos povos originários da Bolívia.


Aji de fideo, um prato típico, uma espécie de sopa feita com macarrão com carne e batatas
Nosso café da manhã 